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quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Quem me dera poder mudar o mundo



Há muito tempo era uma miúda egoísta e apenas pensava na minha pessoa. Vivia centrada em mim e só em mim. O que me fez mudar? Talvez deva começar do princípio, para que possam compreender melhor.
O meu nome é Sabrina. Sou filha única. Bem, quase. Tenho um irmão, o Nuno. Só que ele é tão mais velho do que eu que eu sou tratada como se fosse única, pois ele já vive a vida dele autonomamente. Inclusivamente, ele acabou por contribuir, também, para me tornar naquilo que fui e sou.
Eu fui e sou, ainda e felizmente, a filha muito desejada dos meus pais. Mas, por razões que agora não vêm ao caso, nasci tardiamente, já o meu irmão era um rapaz universitário. Evidentemente, fui o centro de todas as atenções e, como seria de esperar, mimada por todos. Pais e irmão.
Cresci a sentir-me o centro do mundo, embora queira referir que nada disto me foi ensinado pelos meus pais ou pelo meu irmão. Era, de facto, uma pessoa arrogante, vaidosa, caprichosa e, apesar de todos os meus defeitos, sempre fui a menina mais cobiçada da escola, o que fazia subir ainda mais o meu, já de si enorme, ego.
Quando entrei para a faculdade, mantive a minha atitude altiva e egoísta. Os meus pais ofereceram-me um carro que, apesar de em segunda mão, me fazia sentir uma estrela. Eu não podia andar sempre com ele, pois não havia dinheiro que chegasse para o combustível. Os meus pais vivem bem, mas não são ricos e eu, apesar de toda a minha altivez, nunca tentei mostrar ser mais do que aquilo que realmente era, pelo menos desse pecado ninguém me podia acusar. Portanto, habitualmente utilizava os transportes públicos e, muito esporadicamente, o meu carro. Mas gostava de pegar nele, aos fins de semana, e dar umas voltas frequentemente sozinha. Às vezes pegava num livro e despia a minha capa de altivez e egoísmo, conduzia até à praia e deixava-me fascinar pelo ruído das vagas que beijavam a areia, enquanto eu me envolvia com as palavras do livro que me acompanhava.
Um dia, durante o meu regresso a casa de um desses meus devaneios de fim de semana, num dos raros momentos em que o Nuno me acompanhara, conversávamos sobre a minha maneira de ser e como ele discordava da minha atitude. Ele dizia que eu não era nada assim, que deveria mudar, pois era uma pessoa tão doce em casa e tão diferente, quando estava com os meus colegas. Bla, bla, bla,…
Eu escutava-o e, mesmo sabendo que ele tinha razão, tentava mostrar-lhe que não. Foi aí que a nossa primeira discussão se iniciou. Não sei como, em dado momento, talvez porque ainda fosse muito imatura, talvez porque estava muito nervosa, virei-me para o Nuno e, nessa fração de segundo em que desviei o olhar da estrada, não vi que desviei o volante para a berma. Quando me apercebi, era tarde de mais e não pude evitar.
O grito em uníssono, a saída sincronizada do carro, o contorno em perfeita harmonia feita até à parte frontal do carro foi digna de qualquer medalha de ouro. Infelizmente, não estávamos em competição e eu tinha cometido o maior erro da minha vida. Ali, na frente do meu carro, jazia um pobre cãozinho, vítima da minha distração e de toda a minha estupidez. Rapidamente, o Nuno pegou nele e colocou-o no assento traseiro envolto na manta que eu desde sempre trago comigo e transportámo-lo até à clínica dos animais.
Felizmente, ainda hoje a Sortuda vive comigo, pois ela era uma cachorrinha vadia. Eu tive sorte, uma vez que ela apenas teve uma lesão numa patinha, da qual ainda hoje coxeia um pouco, mas é a companheira mais doce que podem imaginar.
“Há males que vêm por bem”. Esta expressão popular tem realmente muito significado. Pois, o que me aconteceu nesse dia mudou a minha vida. Não, não foi apenas porque ganhei uma companheira, mas porque repensei toda a minha vida e deixei que a minha arrogância, o egoísmo e a altivez me abandonassem de vez. Passei a olhar os outros como iguais e a tentar ajudá-los, a cooperar com eles, como os meus pais e irmão sempre me ensinaram.
Eu sei que não consigo mudar o mundo, mas se consegui mudar uma pessoa, eu, talvez isso já possa fazer a diferença e quem sabe eu consiga que outros mudem também e possamos juntos tornar o Mundo num lugar bem melhor!
Sofia Pedrosa, O Ciclista

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