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sábado, 4 de janeiro de 2014

Dia Mundial do Braille


Foi-nos pedido que redigíssemos um texto sobre o Dia Mundial do Braille que se celebra hoje, dia 4 de janeiro. Este pretende, acima de tudo, chamar a atenção para os problemas das pessoas que são invisuais.
Louis Braille, que ficou cego aos 3 anos de idade, foi professor e compositor. Compôs livros para facilitar o ensino e elaborou, com Foucault, um novo alfabeto para cegos, também aplicado à música, à estenografia e ao cálculo, modificando preponderantemente a educação dos mesmos.
Vamos, então, apresentar-vos a história que decidimos criar. 

Invisual não incapaz

Senti ternamente a felicidade da minha mãe. Depois, escutei-a delirante ao dar a notícia ao meu pai. Como ele ficou também emocionado! Pegou nela e rodopiou-nos aos dois no ar e, por fim, decerto exausto pelo esforço, lá acabou por nos deitar no relvado do jardim que circundava a nossa casa e acariciar a barriga onde eu ainda nem sequer me fazia notar.
Os meses foram passando tão rapidamente que me vi no sufoco da saída para o exterior. Pois, o sofrimento também é nosso!
Havia algo de estranho. Falavam de cores, de muitas cores. Mas eu não as conseguia ver.
A mãe? O pai? Escutava-os. Sentia-os. Mas não os via. Eu bem tentava abrir os olhos. Tinha-os aberto. Ou não?! Sim, claro que tinha! O que se passava com eles? Porque não os estava a ver?
A minha mãe decerto que iria falar com o meu pai e ele ia ‘consertar’. Lembro-me de por vezes ela dizer: “Amor, está uma torneira a pingar” e, logo de seguida, ele ia arranjá-la. Portanto, para quê incomodar-me? O papá ia-me, com toda a certeza, ‘consertar’!
A médica pediatra, como lhe chamaram, que me veio ver, disse aos meus pais que precisava de falar com eles. Senti que eles ficaram muito agitados. Porque seria?
- Sabem… - começou a pediatra. – o vosso filho é um bebé saudável.
- Por favor, - disseram os meus pais em simultâneo. – diga-nos o que se passa.
- Com certeza! O vosso bebé nasceu com uma deficiência visual.
- O que é que significa? Estará a dizer-nos que é cego? – ouvi o meu pai a questionar.
- Sim. E, infelizmente, não podemos fazer nada.
Senti, então, a minha mãe levantar-se e pegar em mim ao colo.
- Sabes, meu amor, és o ser mais maravilhoso e perfeito que eu já vi em toda a minha vida. És fruto do amor de duas pessoas que vão cuidar de ti e fazer de ti um homem fantástico, capaz de vencer barreiras.
Senti a força daquelas belas palavras percorrerem o meu pequeno corpo como se um fogo alastrasse pelas minhas veias e as mãos fortes do meu pai, que se juntaram a esse abraço, e isso foi tudo o que eu precisei para compreender que a visão, ou a sua falta, era apenas um pormenor.
Cresci rodeado dessa força que os meus pais e depois também a minha irmã, dois anos mais nova, me deram e continuam a dar.
Aprendi o alfabeto Braille, o que facilitou bastante os meus estudos, era a minha forma de ler, de estudar, de sonhar. Aliás, de sonhar com um futuro em grande como sempre me ensinaram os meus pais, a mim e à minha irmã.
O Braille abre-me fronteiras extraordinárias que me permitem ir cada vez mais longe. A busca do conhecimento tornou-se parte de mim e eu sou feliz.
Atualmente estou a estudar engenharia eletrónica. Na realidade, já estou a fazer o estágio numa empresa e eles pretendem ficar comigo, pois gostam muito do meu trabalho. E eu estou a adorar!
Dizem que um invisual de nascença desenvolve outras capacidades, nomeadamente o sentido auditivo. Talvez tenha sido esse que me tenha levado a estar tão atento a todos os pormenores desde o dia que nasci.
Nunca me esqueço do que os meus pais me disseram naquele dia no hospital: que eu iria ser capaz de vencer barreiras. Penso que não sou só eu. Mas todos nós!

Adriana Matos e Sofia Pedrosa, O Ciclista

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