Estava frio. Era um dia
soalheiro de verão, mas estava frio. Mais ninguém o sentia, apenas ela. Todos
os outros aproveitavam esta época insuportável. Insuportável, sim, para ela. O
Inverno era mais belo, com as suas chuvas e o frio. Esse frio, embora, estava
impossível longe daquele que ela sentia. Estranhamente, não sentia pelo corpo
todo, só no peito. No coração, mais precisamente. Um frio morto e gélido,
acompanhado por um aperto. O que causava isto era certo: a luz e o calor. Este
desconforto quase que se aproximava daquele da dor de cabeça que se avizinhava.
Quase. Havia soluções, umas mais cruas e bárbaras que outras. Uma era cortar. Já
não fazia há anos, mas a vontade sempre esteve presente, a roê-la por dentro, a
provocá-la com o seu riso metálico e doce, tão doce. Inapropriado. Álcool
também funcionava. A sobriedade não ajudava nestas situações e a embriaguez era
outra alternativa. Mas beber sozinha era apenas triste. Estava sozinha. Isso
era outro problema. Também não ajudava. A sua família, bem… já não restava
ninguém além dela; e a sua última relação tinha sido tudo menos saudável. Entre
a violência bruta e o ruído da sua mente a despedaçar, havia apenas tempo para
os comprimidos e os cortes. Já os fazia há anos. Mas durante essa relação a
situação tinha-se agravado…
Reviver o passado era
uma prática dolorosa, mas a mais eficiente, ou antes, aquela que todos
aceitavam visto que ninguém a podia impedir de o fazer. A linha de pensamentos
continuava…
Ela olhava-se ao
espelho, a sua face em ensopada estava. Estava a arder em febre. Finalmente. Há
talvez dois anos que não se sentia assim. Hoje sonharia… Não fosse a alucinação
que lhe aparecia no espelho. Pesadelos seja, era melhor que nada. Era uma cópia
perfeita dela, à exceção da sua pele sem qualquer marca, ou seu corpo que se
parecia manter sempre no peso ideal. O seu clone atormentava-a, apontando para
os seus braços com pequenos riscos e para o seu corpo esquelético. Mas o seu
lugar preferido eram os pulsos. Esses eram tão finos e deformados pelas várias
tentativas falhadas.
Embora a sua companhia fosse claramente
desagradável, era companhia e de entre todo aquele ódio que sentia por ela
existia uma réstia de gratidão. E sumiu-se. Não conseguia deixar de sentir
saudade. Saudade por alguém que não existia e, mesmo assim, não podia ser mais
real. Uma parte de si. A melhor parte de si.
Diogo
Oliveira, n.º 6, 11.º A
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