Sou a Mónica, ou melhor, @moniica067d. Este é o meu nome de usuário no
Instagram.
Estou agora no Rio de Janeiro. Viajei para cá para visitar a minha tia
Lúcia que vive num prédio amarelo com o seu cão em Jacarepaguá.
O meu perfil transborda de fotografias nos mais emblemáticos lugares da
cidade: Ipanema, Copacabana, Cristo Redentor... Loucura.
Perco-me no meio de ruas preenchidas por multidões, de odores, melodias.
Brasil. Entre gostos e comentários, perco-me.
Caminho, descalça, sobre a calçada. Está calor e os meus pés ardem, mas
resisto. Ups... fui de encontro a alguém. Estou tão concentrada a trocar
mensagens com a Ayla, da Turquia, que conheci no Cyber Friends, que não
me apercebo dos obstáculos que surgem. Falo diariamente com dezenas de pessoas
de todo o mundo sobre as tendências do momento. Outro encontrão. Repetidamente,
chegam-me notificações e eu, atrapalhada, procuro ficar a par de tudo. Uma
mensagem do Oliver. Outro encontrão. O sol arde. Sento-me num banco, absorta
neste “mundo virtual” e não reparo nas pessoas que descontraidamente percorrem
as avenidas com chinelos nas mãos, nas palmeiras altas que murmuram, nas
maritacas* verdes que discutem... não olho ao meu redor. Edito fotografias que
partilharei ainda hoje.
As ondas, serenas, aproximam-se e afastam-se, sou capaz de ouvir os seus
suspiros profundos. Está calor, mas o ar é húmido e sinto uma brisa meiga a
infiltrar-se na minha pele. Continuo entretida. Rio de Janeiro. As suas
pessoas. Eu. Eu e o meu mundo. O meu mundo.
Acabei de publicar um conjunto de fotografias rapidamente atacadas por likes.
Desligo o telemóvel e cerro os olhos com toda a força. Volto a ligá-lo.
Respondo aos comentários. Respondo a mensagens. Estou conectada! Num pequeno
dispositivo que é um telemóvel existe um grande mundo, uma confluência de
personalidades, hábitos, ideias, opiniões... de vidas. Vidas. Vidas?
Sinto-me cansada, os raios
solares confundem-se com a luz do ecrã.
Desligo o telemóvel. Olho ao meu redor. A cidade vive. As suas pessoas
vivem. Caminham vagarosamente, descalças, sobre a calçada que arrefece. Mentes
pacíficas. Saboreiam gelados. Saboreiam o momento que estão a viver. Estão isentas
de pensamentos. Não pensam em publicar uma fotografia ou story no Instagram.
O sol está cada vez mais baixo. Os restaurantes começam a abrir e a praia
enche-se de pessoas. Pessoas tão diferentes. Pessoas com vidas diferentes.
Vidas.
Entardecer. O céu adquire um tom alaranjado e as nuvens refletem as
formas do mar. Rio de Janeiro. As pessoas estendem longas toalhas na areia à
espera que se anuncie o início do fenómeno mais belo da natureza: o pôr do sol.
Estão felizes e convivem partilhando momentos do seu dia. Relações autênticas.
Ninguém pensa em escrever um comentário no Twitter. Aguardam. Conversas
afáveis. Risos vivos.
Diversidade. Cada pessoa com a sua personalidade, o seu sorriso, a sua
vida. Todas olham para o mar. Imensidão. Veem-no de forma diferente, mas sentem
o mesmo: liberdade. A melhor sensação.
Levanto-me do banco e a passos lentos, tentando não deixar qualquer
rasto na areia flava, aproximo-me do mar. Fecho os olhos e inspiro a peito
inteiro. Ar.
Penso nas pessoas e penso em mim. Na minha identidade mutável. Sinto uma
espécie de remorso. Nas redes sociais, mostro aquilo que acho mais conveniente.
Crio uma versão otimizada de quem sou.
Sempre acreditei que para ser aceite pelo corpo social deveria ser
possuidora de determinados atributos. Tentei moldá-los em mim e acabei por
perder a minha individualidade e essência.
Eu não sou a @moniica067d, mas sim a Mónica. Sou eu, eu mesma!
Abro os olhos. Liberdade. Sento-me.
Surgem as primeiras estrelas no céu: Vénus, a mais brilhante. Invade-me o cheiro a comida proveniente dos
restaurantes, ao longe, vejo um grupo de pessoas a dançar e cantar ao som de
tambores. O sol abraçou a paisagem. Laranja. Os montes, as palmeiras e os
edifícios tornam-se negros em contraste com a luz do sol. Vermelho.
Ditosamente, bandos de aves exibem coreografias. Cada pássaro entoa a sua
melodia, e, na discordância, juntos, formam uma airosa canção de despedida de
um dia.
Amanhã será outro. O sol desaparece no horizonte.
Aqui, deixo de parte o meu diário digital. Começo a construir a minha entidade,
a partir de vivências e experiências reais. Esta é a realidade. Esta é a minha
vida. Este é um momento que eu tenho de sentir e apreciar.
Pego no telemóvel. Coloco-o em modo de voo.
Anna Shevchenko, 10.º A - Escola Básica e
Secundária de Anadia
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