O rapaz que
queria ser mar
De entre todos os
sentimentos, há um que me fascina particularmente: a liberdade. Não há nada
melhor que poder ir aonde quisermos e quando quisermos ou ainda fazer o que desejarmos,
precisamente quando quisermos. Porém, nem todas pessoas gozam dessa felicidade
e muitos são os que se encontram presos por muros e paredes que outros erguem
ou que eles próprios constroem.
Esta história, que
vou passar a contar, é a de um rapaz que se chamava Joaquim e que não tinha nem
uma pequena noção de liberdade, pois nunca a possuíra.
Joaquim era um rapaz
doce, meigo, simpático e bem-educado, mas era também muito inseguro e facilmente
manipulado. Fazia tudo o que os seus amigos da escola lhe pediam, concordava
com tudo o que decidiam e sempre que lhe pediam uma opinião, dava sempre a que
lhe parecia agradar aos outros, mesmo quando no seu íntimo não era aquilo que
realmente sentia ou queria. De facto, não conseguia contrariar a vontade de ninguém,
nem conseguia dizer o que sentia, pois temia que os outros reagissem mal, que
não estivesse à altura das suas expetativas ou que ficassem desiludidos
consigo.
Joaquim vivia
acorrentado por si próprio e triste, muito triste.
Quando queria
relaxar, o rapaz ia para a beira-mar observar o oceano, um dos únicos sítios
onde descontraía e se refugiava de tudo o resto. E lá ficava o tempo que queria.
Gostava assim de ver as gaivotas, as ondas, as conchas. Apreciava cada
centímetro daquela vista maravilhosa.
Joaquim apreciava o
mar. Aliás, admirava a força do mar e, no seu íntimo, ambicionava ser como o
mar. Pode parecer uma comparação estranha, mas está cheia de verdade. Sim,
porque não há nada mais livre que o vasto oceano. Viaja por onde quer e quando
lhe apetece. Por outro lado, toca todos os continentes. Quando quer, é calmo e
quente, a imagem da paz e tranquilidade. Noutras alturas agita-se, eleva-se e
enche- -se de espuma que parece lembrar a sua raiva e assustar quantos o
observam. Tem tanto poder o mar! É tão livre!...
Joaquim, em contrapartida, sentia-se frágil.
Por mais que quisesse, este rapaz seria sempre, na melhor das hipóteses, um
pequeno e fraco ribeiro que corria sempre para o mesmo lado e nunca deixaria de
ser assim, se continuasse a ignorar os seus próprios sentimentos. Para sua
infelicidade, assim foi durante muito tempo.
Certo dia, os seus
pais decidiram mudar de casa e ir viver para o interior do país. Como sabiam
que Joaquim era tão fácil de manipular, nem sequer pediram a sua opinião.
Quando ele teve conhecimento da notícia, sentiu um forte aperto no coração.
Como iria ele sobreviver sem o mar? Sem a sua inspiração? Sem o conforto que
este lhe dava quando estava triste, quase sempre triste consigo mesmo?!
Um sentimento de angústia
inundou o interior do rapaz. Sentia-se perdido, abalado. Lembrou-se que por
enquanto ainda tinha um sítio para se refugiar. Então, correu e correu o mais
rápido que conseguia para a praia.
Durante breves
momentos, Joaquim pensou em como seria poder expressar-se, combater os seus medos
e então, apercebeu-se que, quanto mais ele resistisse à vontade das outras
pessoas, maior seria a sua liberdade. De repente, começou a sentir no seu peito
a força das marés que o queria sacudir e fazer despertar. O cheiro do mar
invadiu-lhe os pulmões como se fosse um remédio que o queria trazer à vida. À
vida que ele tinha que viver sem medos. Joaquim não soube como, mas de repente sentiu-se
mais confiante e determinado que nunca e entendeu de imediato que aquele era o
momento certo para falar com os pais e partilhar com eles os seus sentimentos e
desejos.
Já na companhia dos
pais, Joaquim não sabia bem por onde começar ou qual seria a altura certa para
falar no assunto. Assim que conseguiu a sua atenção, Joaquim deu-lhes a sua
opinião sobre a mudança e como tal, falou-lhes da sua necessidade do mar, e
também de como se sentia, quando era obrigado a fazer tudo o que os outros
queriam.
Para o rapaz, este
foi o momento mais importante da sua vida até então, pois teve um comportamento
totalmente diferente daquele a que estava desde sempre habituado. Foi doloroso…
Contudo, foi libertador.
Os pais acabaram assim por dar prioridade aos
sentimentos do seu filho e entender o que na realidade o assustava todos os
dias. Perceberam o quão difícil era para o Joaquim querer partilhar uma opinião
mas contrariando a sua vontade, com medo que não fosse aceite pelos outros. Valorizaram
a sua coragem ao, finalmente e pela primeira vez, assumir uma posição: a “sua
posição”.
No final, tudo ficou
bem pois os pais de Joaquim decidiram não mudar de casa, e o rapaz perdeu todo
o medo de se expressar, deixando assim de ser apenas mais um pequeno curso de água
controlado por tudo e todos. Cresceu para se tornar um oceano com vontade própria,
mas que dia a dia aprendia a lutar contra as tempestades que surgiam sem, no
entanto, contrariar a sua natureza.
Clara Verdade Loureiro, nº 7, 8º C
ESCOLA BÁSICA Nº 2 DE ANADIA
AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE ANADIA
Ano letivo: 2012 - 2013
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