4º e último Episódio
Ela desapareceu a correr e eu deixei-me estar
sentado. E deixei cair a máscara. Não acreditava no que tinha feito. Era capaz
de muito, mas de mentir assim descaradamente à pessoa que mais amei na vida,
foi muito baixo, mesmo para mim… mas não havia mais nada a fazer. Não podia
magoar o meu irmão, que há tanto a amava, para que eu pudesse ser feliz. Não
podia, não depois do que aconteceu…
Fui eu o culpado
do seu sofrimento. Fui eu que conduzi o carro que levava a pessoa que ele mais
gostava no mundo. Fui eu que matei a namorada do João, e, embora me
mentalizasse que foi um acidente, que a culpa não foi minha, todos os dias me
lembrava daquele momento…Porque não fui eu que morri naquele acidente? Seria
tudo muito mais fácil, seriam todos mais felizes…
Eu tinha que sair dali… Voltei para minha
casa, fechei-me e não quis ver ninguém…
Passados dois dias, alguém bateu à porta.
Bateu, bateu, e insistiu.
Desci as escadas irritado, abri a porta e
gritei sem sequer olhar.
- Quem for que se vá embora!
- Queres mesmo que me vá embora? – murmurou uma
voz familiar, que há muito me assombrava o pensamento. Lenvantei a cara.
- Margarida, que estás aqui a fazer? Pensei
que tinhas dito que nunca mais me querias ver…
- E não. Mas precisei desabafar com alguém e
o teu irmão apareceu lá em casa…
Fiquei em pânico. O que teria o João lhe
dito?
- O João contou-me tudo Rui… porque não me
disseste nada? Sabes que podes confiar em mim!
Não acreditava nas palavras que saiam da sua
boca: o que pensaria ela de mim, agora que sabia do monstro que era, do que era
capaz de fazer… comecei a chorar.
Ela olhou para mim, deu-me um abraço longo e
murmurou-me ao ouvido:
- Estás terrível… Precisas de apanhar ar…
Saimos para o pátio nas traseiras e aí
ficamos até longas horas da tarde, abraçados, apoiados um no outro.
- Já reparaste que agora os papéis se
inverteram? Só me custa entender o porquê de guardares tudo isto para ti… de
não pedires ajuda…
- O problema –
retorqui – é que só me apercebi que precisava de ajuda quando não tinha mais
forças para pedi-la. Mas contigo aqui eu sei que vai ficar tudo bem…
- Não achas um pouco irónico?! Apaixonaste-te
por uma paciente que tem o mesmo problema que tu? Quem diria…
- Acho… Não achas irónico que o psicólogo que
tenta “consertar” tudo e todos seja o que agora está a precisar de conserto?
- Acho é todos precisam de um arranjo durante
a vida… quer dizer, não somos máquinas perfeitas, pois não? Os erros e os
receios, as coisas boas e as coisas más, tudo o que nos acontece escreve a
nossa história. É a forma como lidamos com elas que molda o nosso carácter, a
nossa personalidade. E tu és um lutador, senão não tinhas lutado por mim… e eu
espero ser a tua razão de lutar, porque tu és a minha… Não tenhas medo: olha
para mim agora e lembra-te como era antes de te ter conhecido… Tu deste-me
força para me tornar quem eu sou hoje. Aceita a minha ajuda!
Senti o vazio do meu coração começar a
preencher-se, a minha alma a lavar-se.
O sol desapareceu no horizonte. Recordei-me
do dia em que a conheci, e apercebi-me que já não tinha os mesmos horários, a
mesma rotina… E apercebi-me das pequenas mudanças que ela causou na minha vida
naqueles poucos meses em que estivemos juntos… e do quanto gostava dessas
transformações. Sorri, e ela, ao ver-me feliz, abraçou-me ainda mais. E sem
dúvidas ou incertezas murmurei-lhe ao ouvido:
- Amo-te.
Ela retorquiu:
- Convenceste-me.
E naquele perfeito momento eu sabia que ela
estaria sempre ao meu lado para o que fosse necessário, ia ser o meu porto de
abrigo na tempestade.
Ela ia ser a
minha rotina.
Ana Cristina Quintans da Silva
Escreve muito biem, pois a histoirea está interessant, continue a escrever.
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