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domingo, 2 de setembro de 2012

Nunca é tarde para aprender!


Concurso literário “Ler e Aprender”
Texto género narrativo escrito pela aluna Sofia de Matos Pedrosa, concorrente e vencedora do 1º prémio no Concurso literário “Ler e Aprender”, 3º Ciclo, edição de 2012.

A Equipa d´O Ciclista

Nunca é tarde para aprender!

1º Episódio
Há muito tempo que ansiava por um dia como este.
Nos meus mais secretos sonhos, via-me sentada na mesa de jardim, a escrever. Era um sonho que desde sempre povoava o meu pensamento. Contudo, durante décadas, manteve-se simplesmente adormecido, quase esquecido, ou lembrado com dor. Dor de não o ver concretizado. Dor, por não o conseguir alcançar. Esse sonho quase ficou esquecido para sempre!
Até aos sete anos, adorava olhar para o meu irmão e vê-lo pegar na sacola e, com ela a tiracolo, partir para a escola, para onde eu já deveria ir. Na verdade, invejava-o pelo simples facto de ser mais velho e já ter idade para aprender a ler e a escrever. Até essa idade, ainda me foi permitido sonhar.
No dia em que completei os meus sete anos, a minha mãe disse-me que tinha uma prenda para mim. Era hoje! Chegara finalmente o dia em que a mãe me iria dizer, como fizera há três anos com o meu irmão, que em outubro eu iria para a escola. Então, dar-me-ia o mais belo presente, embrulhado em papel pardo, aquele pelo qual eu tanto e há tanto tempo esperava: uma pasta para eu concretizar assim o meu sonho.
Sabia que não seria uma pasta nova, pois já tinha passado pelas mãos de uma das filhas da patroa da minha mãe, mas para mim seria sempre nova. Porém isso era sonhar alto. No entanto, não me importava se fosse apenas uma sacola feita de sarapilheira, como vira já a algumas das meninas que passavam para a escola. Não importava, já que eu iria torná-la na sacola mais bonita que jamais existira. Por outro lado, bordaria um grande livro aberto e nele escreveria o meu nome. Não na sua totalidade. Simplesmente Nazareth.
Dentro da pasta, ou da sacola, estaria uma lousa de ardósia e um pau de giz, que guiaria a minha mão, fazendo-a dançar em círculos e em linhas direitas, desenhando as letras que eu escreveria para no final poder ler aquelas palavras perfeitas, que a professora me iria ensinar.
Depois de engolir a côdea de broa e o café acabado de coar, aguardei pela minha surpresa, a minha bela prenda de anos!
A minha mãe entrou na ampla cozinha da nossa casa, com o cântaro de água à cabeça, que tinha ido buscar à fonte, e disse-me para a ajudar. Levantei-me de um salto e tirei-lho da cabeça depositando-o, com dificuldade, pois era muito pesado, sobre o armário que se encontrava junto à banca de pedra. De seguida, coloquei o prato sobre a boca do cântaro de barro e a caneca virada para baixo, os dois feitos de esmalte.
- Vai acendendo a lareira que já volto.
Pegando nas agulhas e na lenha, que já fora buscar ao alpendre nessa madrugada, fiz uma bela fogueira. Entretanto, fui colocando a panela de ferro preto sobre a trempe para a sopa do almoço. Durante a manhã, enquanto a minha mãe ia trabalhar para a mansão dos senhores Miranda de Azevedo, eu descascaria as batatas, arranjaria a abóbora, os nabos, as couves, que ainda tinha de ir cortar ao quintal e, com um pouco de toucinho, que tiraria da salgadeira, faria uma bela sopa.
A minha mãe entrava entretanto na cozinha, amarrando o seu lenço preto na cabeça, cor que usava desde que o meu pai partira para o céu. Agora, eu iria receber a minha prenda. Mas, afinal a minha desilusão acompanhou o meu dia. A mãe esquecera-se de ma dar.
O dia decorria e apesar do grandioso sol, que sorria para mim, eu sentia um vazio muito grande.
Fui fazendo as minhas lidas e tentei abstrair-me do meu dia de anos. Por isso, dirigi-me ao quintal e apanhei a comida para o gado. Com a foice ceifei alguma erva, pois era necessária para na manhã seguinte lhes fazer as camas de lavado, como eu gostava de pensar e, com as couves debaixo do braço, fui fazer o almoço.
Ao meio-dia, levei o farnel à minha mãe a casa dos senhores e ela apenas me disse para ir direita a casa e fazer bem as minhas tarefas.
- Não te distraias! Já sabes que, se algo estiver mal, levas uma tareia.
 Ai, não que não sabia! Ainda me doía o rabo das vergastadas levadas há dois dias atrás, quando deixara cair um dos ovos que fora buscar ao galinheiro.
Arrastei, então, os tamancos pelo caminho de pedras que me levaria a casa, sem conseguir deixar de pensar no meu aniversário. Afinal, era uma data muito importante, principalmente porque chegara a hora de ir para a escola, aprender e também brincar com as outras meninas, no intervalo da manhã. Ah! Como seria bom saltar à corda com elas, jogar às apanhadas e saltar à macaca.
No entanto, entrei em casa com a certeza de que estava triste e que não podia piorar mais o meu dia, que era o que iria acontecer, se não fizesse tudo o que a mãe me destinara.
Comecei assim por despejar água na grande bacia de barro. Depois de ter agitado a água para que a gota de detergente, que entretanto colocara, fizesse um pouco de espuma, pus os pratos coloridos de barro, já muito gatados, dentro da bacia e, em cima do mocho, que fui buscar para chegar melhor à louça, lavei-os.
O chão estava bem esfregado, embora os joelhos me ardessem por causa de os ter arrastado no cimento que o cobria. Mas sempre era melhor que a terra que antes existia. O tio Nando, o irmão da minha mãe, que é trolha, no início do verão, tinha conseguido um pouco de cimento e, com ele, transformou a nossa cozinha numa verdadeira beleza. Agora, parecia mesmo uma cozinha de bonecas. Não que alguma vez tivesse visto alguma, nem cozinha nem bonecas, mas era assim que as imaginava.
Era a vez de apanhar a roupa, que eu ajudara a mãe a lavar ainda o sol não acordara e que estendera de manhãzinha. Peguei no cesto de verga e fui apanhar a roupa das cordas que dançavam ao som da bela melodia tocada pelo vento. Lembrei-me do que a mãe me ensinara: "Dobra bem a roupa, pois a roupa bem dobrada é roupa meia passada." E, assim fiz.
A cozinha já estava enxuta, por isso fui junto à lareira e peguei na panela das brasas e coloquei-as no ferro preto de passar a roupa. Estendi o velho cobertor sobre a mesa da cozinha e, como o ferro já estava quente, passei a roupa.


Continua…

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