Eu sou a Ana Sousa Pereira, tenho 15 anos e vou contar a minha história. É difícil recordar tudo isto, mas sinto a necessidade de desabafar, já que nunca tive esta oportunidade. Por isso, vou simplesmente escrever, não obrigando ninguém a ler, pois nem todas as histórias são boas, ou têm finais felizes…
Bem, acho que vou começar pelo início. Eu nasci no Porto, a 30 de julho de 2005. Minha mãe, Maria Oliveira Pereira, deu-me à luz às 11H da manhã, mas o meu pai, João Sousa Pereira, não estava lá. Sinceramente, nunca me disseram onde ele estava, mas também não sei se quero saber…
De todas as recordações que tenho até agora, são poucas aquelas de que tenho saudades… Sim, tive uma infância muito difícil… O dinheiro era pouco, pois só a minha querida mãe trabalhava, fazia limpezas num supermercado. O meu pai não trabalhava, não ajudava em casa, só dava despesa. Estava sempre bêbado. Costumo dizer que não era cada dia uma bebedeira, era sempre a mesma, só que nunca passava. Este homem estava sempre aos berros, era agressivo e só dizia asneiras, meu Deus…
Lembro-me de um episódio, eu devia ter uns 8 anos, estava a chegar da escola e, quando abri a porta, ele dá um estalo com tanta força na cara da minha mãe que ela caiu para o lado. Atirei a mochila ao chão e fui a correr para junto da minha mãe… O homem foi-se embora e a minha querida mãe dizia-me, enquanto as lágrimas lhe corriam pelo rosto:
- Não te preocupes, meu amor, a mãe está bem…
- Amo-te muito, mãe! Podes contar comigo – disse eu, encostando o meu rosto junto ao seu…
É um episódio que nunca esquecerei, infelizmente…
Os dias iam passando, um mais difícil do que outro. A única coisa que eu tinha na vida era a minha mãe, e custava-me muito vê-la a sofrer. A violência ia-se agravando, até que, um dia, tinha chegado a minha vez… Senti na pele o que a minha mãe sentia… E é tão doloroso!…
Na escola, não me conseguia concentrar. À noite, não conseguia dormir. Cada vez que fechava os olhos via a minha mãe a chorar, caída no chão e uma mão a vir na minha direção.
Eu e minha querida mãe não tínhamos nenhum lado para fugir, não havia dinheiro. Éramos só nós duas…
Comecei a crescer. Já tinha 13 anos e a violência continuava. Num dia de verão, não aguentei mais, não aguentei ver o sofrimento da minha mãe e, por isso, cometi um ato. Ele estava a dormir, a minha mãe estava na cozinha e eu estava com um jarro na mão. Sim, eu fiz isso… Estive muito tempo com o jarro para cima, a pensar se era a coisa certa até que ele levantou a cabeça e… aconteceu… Comecei a correr e disse à minha mãe “Vamos fugir!”. A minha mãe ficou assustada, mas veio comigo, porque estava tão desesperada quanto eu.
Pegámos em algumas roupas, num espaço de 2 minutos e fugimos! Fomos para a estação e apanhámos um comboio para Coimbra, onde viviam os meus avós maternos.
- Eu não aguentava mais… Tinha que fazer isto, quero recomeçar uma vida nova cheia de felicidade e tenho a certeza que eu e tu, minha querida mãe, vamos ter tanta felicidade como tanta tristeza tivemos.
- Desculpa, meu amor…- disse a minha mãe, chorando.
- Ei! Não tens que pedir desculpa! Tu és uma mãe maravilhosa! E eu amo-te muito!
Soube, depois, que o tinha deixado inconsciente, mas que estava a recuperar. Por momentos, senti-me culpada, mas achei que tinha sido o mais correto.
Quando chegámos a casa dos meus avós, a minha avó ficou muito triste por aquilo que tinha acontecido, mas feliz por estarmos junto dela. O meu avô conseguiu convencer a minha querida mãe a ir à polícia. Finalmente, as coisas começavam a correr bem. A minha mãe conseguiu arranjar trabalho num infantário. E eu podia finalmente desfrutar de um verão, sem chatices.
Até que, um dia, o meu mundo voltou a ser ainda pior que o antigo… Perdi a pessoa mais importante da minha vida graças a esse homem estúpido! A minha mãe estava a ir para o trabalho, a pé, pois era perto de casa. Estava a atravessar a estrada quando ele meteu o pé no acelerador e foi contra ela… Deixou-a em coma, mas não resistiu… Muito provavelmente, ele já nos andava a vigiar há muito tempo. Só não sei como é que ele descobriu onde estávamos!
Neste momento está preso, mas a minha querida mãe levou consigo uma enorme parte de mim. Fui eu que fiz com que ele cometesse aquilo! Agora, diariamente, olho para o espelho e digo-lhe “Eu não quero mais ser tu, não quero ser uma pessoa que matou a mãe!” Todos os dias, são uma luta constante e não há uma noite em que eu consiga dormir bem. Agora, tenho que sobreviver com o facto de que eu matei a minha mãe, a minha querida mãe de quem eu tantas saudades tenho! Pergunto constantemente a Deus: “Por que é que ele a levou a ela e não a mim?” Não consigo viver sem ela! Estou em desespero total! E eu amo-a tanto e tenho tantas saudades... minha querida mãe…
Leonor Ferreira, 8.º A, Escola Básica de Vilarinho do Bairro
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